Seguindo a programação do Brazilian Film Festival of London, a ‘Navalha do Avó’ foi o curta escolhido para anteceder ‘Tatuagem’. Direção singela de Pedro Jorge, é outro filme no Festival que fala da vida dos avós. Delicado e sensível o filme tem semelhança com ‘Memórias de Maura’ de Bruna Lessa por também tratar de relação entre os avós e os netos e e o derradeiro aproximar da morte
Mas uma das estrelas do evento foi “Tatuagem”, de Hilton Lacerda, que é um filme comovente, sim! Não é a toa que fez uma linda carreira no Brasil e foi premiado como melhor filme em 2013 no Festival de Gramado – o que justifica, é claro, ele ser a escolha da sessão das 8:30 de sábado para o BFFL.
Tropicalista, anarquista, de temática gay e evocativo à história do Brasil e à situação referente ao fim do período do Golpe Militar de 64, precisamente em 1978. O filme apesar de brasileiríssimo comunica ao público estrangeiro, que lotou junto a brasileiros a sala de exibição, e serve de resposta à preocupação do produtor: “se o filme comunicaria universalmente, ou não”. João Vieira Jr., o produtor, esteve presente para a sessão de perguntas e respostas que sucedeu a projeção do filme, para uma sala entusiasmada entre gargalhadas e ovações durante a exibição.
João Vieira Jr. foi uma grande soma a exibição, pois, naturalmente, por tê-lo produzido, conseguiu cobrir todas as perguntas do público e foi além. Ele acrescentou curiosidades da produção como, por exemplo, que as pesquisas para embasar o comportamento das personagens e a textura da imagem foram influenciadas por filmes de 8mm de artistas plásticos da época da ditadura (pré VHS). Ou que a maior parte dos atores são residentes em Olinda, onde o filme se passa, mas que, entretanto, são iniciantes e foram preparados pelo protagonista do filme, o veterano Irandhir Santos.
O produtor
Diga-se de passagem o curriculum de João Vieira Jr. inclui filmes como “Cinema, Aspirinas e Urubus” (2005), de Marcelo Gomes, exibido em Cannes; “O Céu de Suelly” (2006), de Karim Ainüz, “Baixio das Bestas” (2007), de Cláudio Assis e do documentário “KFZ -1348”, de Gabriel Mascaro e Marcelo Pedroso. Todos filmes de impacto na cultura cinematográfica contemporânea brasileira, de Pernambuco e do Sertão. Impressionate não é? Mais voltemos a Tatuagem, seu projeto mais recente…
Longa nordestino de temática gay
Primeiro filme de longa metragem gay de Pernambuco, por vezes “Tatuagem” pode lembrar nuances de “Priscilla, A Rainha do Deserto”, por terem em comum personagens, performers, com a trupe mambembe Chão de Estrelas. Pode também ressoar a câmera inquieta do “Madame Satã”, de Karim Ainüz, ou referenciar os famosos Dzi Croquettes.
Entretanto é legitimo, autêntico, bem escrito e não deve nada a nenhum dos filmes anteriores. O roteiro foi construído como um musical e boa parte das canções interpretadas pela trupe foram criadas especialmente para o filme, evitando assim o caro custo pago por direitos autorais. Talvez por isso, a clássica canção de Chico Buarque “Tatuagem” não figure no filme.
A trilha sonora irradia a vida das personagens e dá espaço a performances bem realizadas, politizadas e divertidas de se ver. Esse universo rico em referências serve então de cenário para uma história de amor entre dois homens de gerações e profissões diferentes, um é ator, o outro é um cadete do exercito. E nesse meio, de um lado a extremidade livre, artística e criativa, e no outro, a extremidade contida, militar e reprimida que experienciamos o romance, não clichê, diga-se de passagem, entre Clécio e Fininha. “Tatuagem” é um filme sobre o amor e os obstáculos que esse sentimento supera pra se fazer presente, assim como o filme desde já é anacrônico.
Veja o trailer: